Eletrólitos, aspéctos clínicos

Compilado de artigos e publicações de autoria:
Dr. Celso Cukier
Dr. Daniel Magnoni

As necessidades específicas de eletrólitos relacionadas nos manuais clínicos, apresentam em grande parte deles, deficiências em objetividade e aplicabilidade no dia a dia do profissional de nutrição.

Desta forma, procuraremos em poucas linhas elencar as principais características clinicas necessárias ao manuseio de pacientes graves.

A estrutura orgânica do homem é bastante similar à água do mar, exceto pela presença de proteínas na composição química dos diversos compartimentos hídricos. Distingue-se a presença de minerais, substâncias inorgânicas, nos diversos compartimentos. São elementos com funções orgânicas essenciais, que atuam na forma iônica e na composição de diferentes substâncias (enzimas, hormônios, secreções e proteínas teciduais). Exercem influência na regulação do metabolismo enzimático; manutenção do metabolismo ácido-básico, irritabilidade muscular e pressão osmótica. Facilitam a transferência de compostos pelas membranas celulares e composição de tecidos orgânicos. Têm funções sinérgicas entre sí, visto que o excesso ou deficiência de um interfere no metabolismo de outro. Podem ser classificados em:

a)      Eletrólitos: Importantes na manutenção do equilíbrio hidro-eletrolítico (sódio, cloro, potássio);

b)      Macronutrientes, ou minerais presentes em maiores concentrações no organismo (cálcio, fósforo, magnésio, enxofre);

c)      Micronutrientes, presentes em menores quantidades, mas com funções específicas essenciais (ferro, zinco, cobre, iodo, cromo, selênio, manganês, molibdênio, níquel);

d)      Elementos ultra traços, presentes em diminutas quantidades e com funções metabólicas ainda não totalmente elucidadas (flúor, cobalto, silício, vanádio, estanho, chumbo, mercúrio, boro, lítio, estrôncio, cádmio, arsênio). Discutiremos isoladamente os minerais de maior importância na prática clínica (quadro 1).

Cálcio (Ca): Macroelemento, importante nos processos de coagulação sangüínea, excitabilidade neuromuscular e transmissão dos tecidos nervosos. É essencial à manutenção e função das células da membrana. Sua absorção ocorre de 20 a 40% pela ingestão oral, por processo ativo, principalmente no duodeno e jejuno, sendo dependente da presença de vitamina D e da proteína de ligação do cálcio. Está presente na circulação preferencialmente em sua forma iônica (50 a 65%) ou ligado à albumina. A reabsorção renal ocorre em até 99 por cento e sua excreção é principalmente urinária (150 a 250 mg/dia) e fecal (150 mg/dia), havendo menores perdas pelo suor, bile, suco pancreático e saliva.

Fósforo (P): Macroelemento, cofator de múltiplos sistemas enzimáticos do metabolismo de carboidratos, lipídeos e proteínas. Componente do ATP (fosfato de alta energia), ácidos nucleicos e fosfolípides. Responsável por modificações no equilíbrio ácido-básico plasmático (tamponamento) e regulação da excreção renal de íons de hidrogênio. Importante para mineralização e estrutura óssea, síntese de colágeno e homeostase do cálcio. Influencia a regulação metabólica de hormônios (paratormônio, hormônio de crescimento) e utilização de vitaminas ( vitamina D e complexo B). Sua absorção ocorre de 70 a 90% na ingestão oral, no jejuno, como fosfato livre. Está presente como fósforo nos tecidos e ossos e como íon fosfato no fluído extracelular. É armazenado nos ossos (85%), músculo esquelético, pele, sistema nervoso e outros órgãos. Ocorre reabsorção renal  de 85 a 90% (4 a 8 mg/min) e sua excreção pode ser urinária (50 a 70%) ou fecal (30 a 50%).

Potássio (K): Cátion intracelular, essencial à síntese de proteínas e metabolismo de carboidratos. Apresenta especial influência na transmissão nervosa, tonicidade intracelular e contração muscular, especialmente da musculatura cardíaca. É absorvido em 90% na dieta oral. Circula no plasma ligado à proteínas (10 a 20%) sendo armazenado principalmente na musculatura esquelética. Está  presente em maior concentração no espaço intracelular (98%), sendo mantida a diferença de concentração por meio de sistema enzimático ativo (NaKATPase) presente na membrana celular. Sua reabsorção e excreção são mediadas pelo rim, havendo fatores que as influenciam como equilíbrio ácido básico, ingestão de sódio e volume filtrado. Menores quantidades são excretadas no suor e fezes.

Sódio (Na): Principal cátion do fluido extracelular é essencial à manutenção da pressão osmótica do sangue, plasma e fluidos extracelulares. Sua absorção ocorre rapidamente no trato gastrointestinal, sendo menos absorvido nas formas de fosfato, tartarato e sulfato de sódio. Está presente em maior concentração no fluido extracelular (135 a 145 mEq/l), sendo seu gradiente de concentração dependente do sistema enzimático Na-KATPase. A excreção é principalmente urinária, havendo reabsorção de até 99 por cento. É modulada pela ingestão ou por ação hormonal (aldosterona e hormônio anti-diurético). Menores quantidades de Na são excretados pelo suor e fluidos gastrointestinais.

Magnésio (Mg): Macroelemento, ativador de sistemas enzimáticos que controlam o metabolismo de carboidratos, gorduras, proteínas e eletrólitos. Cofator da fosforilação oxidativa, influencia a integridade e transporte da membrana celular. Media as contrações musculares e transmissões de impulsos nervosos.

Absorção de Mg ocorre de 30 a 50% na ingestão oral, na porção jejuno-ileal do intestino delgado. O Mg circula ligado à albumina e é armazenado nos ossos (60 a 65%), músculos (27%) e outros tecidos (6 a 8%). É reabsorvido de forma ativa no néfron e passiva no túbulo proximal. Ocorre excreção urinária (1,4 mg/Kg/dia) e fecal (0,5 mg/Kg/dia).

Zinco (Zn): Microelemento ou elemento traço, exerce funções específicas atuando no crescimento e replicação celular, função fagocitária, imunitária celular e humoral, maturação sexual, fertilidade e reprodução. O Zn atua na estabilização de lisossomas nos processos de síntese protéica e de membrana para a circulação de elementos celulares. A absorção de Zn é de 10 a 40% da ingestão oral, no duodeno e jejuno, passiva, formando complexos com ligantes endógenos e exógenos (histidina, ácido cítrico e ácido picolínico). Circula no plasma e sangue ligado à albumina e aminoácidos (55%) e macroglobulinas (40%) não se destinando a uso metabólico. O Zn é armazenado no fígado, ossos, pele e tecido ocular. A excreção de Zn é fecal (10mg/dia) ocorrendo em menores quantidades pela urina, pele, cabelo e sêmen.

 
VIA ORAL/ENTERAL (mg)
VIA PARENTERAL
 

CRIANÇAS

ADULTOS

CRIANÇAS

ADULTOS

Cálcio (Ca)

800-1200

800-1200

1-4     mEq/Kg

10-15

Fósforo (P)

300-800

800-1200

1,36     mM/Kg

30

Potássio (K)

500-700

2000

2-4     mEq/Kg

> 60

Sódio (Na)

120-400

500

2-3     mEq/Kg

> 60

Magnésio (Mg)

80-170

270-400

0,3-2   mEq/Kg

13-30

Zinco (Zn)

5-10

12-15

150-300  mg/Kg

4 mg

Quadro 2: recomendações diárias de sais minerais de maior importância na prática clínica

Referências

1.    Council on Scientific Affairs – Vitamin preparation as dietary suplements and as therapeutic agents. JAMA. 257(14), 1987

2.    Dempsey, D.& Hodges, R. E. – Parenteral vitamin therapy in hospital patients. In Rombeau, J.L. & Caldwell – Parenteral Nutrition. vol 2, cap 7, pp 154, W.B. Saunders Company, 1986.

3.    Hoyumpa, A.M. – Vitamin deficiencies in the alcoholic patient. In. Nutritional support in alcoholic patients postgraduate course 12. Aspen 8 th , Clinical congress, Las Vegas, 1984.

4.    Levenson, S.M. – Micronutrients (vitamins, trace minerals). Sixteenth Clinical Congrass (ASPEN), 19-22, 189-198, 1992.

5.    Lima-Gonçalves, E. – Nutrição e Cirurgia. 1a ed., pp 3-13, Sarvier, 1988.

6.    Melki, A.L.; Bulus, N.M.; Abumrad, N.N. – Trace elements in nutrition. Nutr. Clin. Pract. 2(6):230-40, 1987.

7.    Recommended dietary allowances (RDA) – 10th edition. Subcommittee on the tenth edition of the RDAs Food and Nutrition board Commission on Life Sciences. National Research Council. National Academy Press Washington, D.C., 1989.

8.    Shils M.E. & Young, V.R. – Modern nutrition in health and disease. Cap 5-11, pp 142-291 Lea & Febiger, Philadelphia, Ed 7, 1988.

9.    Waitzberg, D.L. – Nutrição enteral e parenteral na prática clínica. 2a ed. Rio de Janeiro. Editora Athene, 1995.

10. Weinsier, R.L.; Heimburger, D.C.; Butterworth, C.E. – Clinician’s manual for the prevention, diagnosis and management of nutritional problems. The C.V. Mosby Company, ed. 2, 1989.