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Ácidos graxos Omega 3 na Imunonutrição

Dr. Celso Cukier

O que são ácidos graxos omega-3 e qual sua relação com o óleo de peixe?

Ácidos graxos omega-3, representados como n-3 ou w-3, são assim denominados por possuírem sua primeira dupla ligação no carbono 3 a partir do radical metil do ácido graxo e podem ser representados pelas formas n-3 ou w-3. São ácidos graxos poliinsaturados de cadeia, representados pelos ácidos -linolenico (18:3n-3), eicosapentaenóico (EPA - 20:5n3) e docosahexaenóico (DHA - 22:6n-3). Os ácidos graxos w-3 estão presentes nos triglicérides dos fitoplanctons. São consumidos e encontrados em altas concentrações em peixes e animais marinhos. Os primeiros relatos sobre o metabolismo dos ácidos graxos omega-3 surgiram na década de 70, a partir de estudos na doença coronariana. Esquimós da Groelândia, apesar do alto consumo de dietas ricas em gordura com elevados teores de colesterol e baixa ingestão de carboidratos, apresentaram baixos níveis de colesterol total, triglicérides, lipoproteínas de densidade muito baixa (VLDL), e níveis maiores de lipoproteínas de alta densidade (HDL), relacionados a menores índices de doenças cardiovasculares.Nos esquimós a doença cardiovascular manifesta baixos índices de mortalidade (10,3%) em relação à população norte americana (50%). Os esquimós também têm baixa incidência de asma, psoríase, doenças auto-imunes e diabete mellitus e maior incidência de doenças hemorrágicas e epilepsia.

O que é eicosanóide e como agem?

O termo "eicosanóide" relata um grupo de ácidos graxos oxigenados compostos por 20 carbonos. Seu maior precursor é o ácido araquidônico (ácidos cis 5,8,11,14-eicosatetraenóico). São formados por três vias principais, compostas pelas enzimas ciclooxigenase, lipoxigenase e epoxigenase, tornando-se as duas primeiras de maior interesse, por originar os metabólitos relacionados às reações inflamatórias. A interação de um estímulo (bradicinina, angiotensina II, hormônio anti-diurético ou uma protease como a trombina) sobre a membrana celular resulta em ativação da enzima fosfolipase, enzima esta cálcio dependente. Aproximadamente 15% do ácido araquidônico existente na membrana celular é mobilizado. Uma vez produzido, o ácido araquidônico é atacado por uma enzima conhecida como PGH sintase, cuja forma ativa encontra-se no retículo endoplasmático. A PGH sintase apresenta duas formas de atividade catalítica. A primeira é mediada pela ciclooxigenase que catalisa a formação de PGG2 a partir do ácido araquidônico. A segunda forma facilita a redução de PGG2 para PGH2. A catalização da PGH sintase leva à formação de prostanóides da série 2, mais conhecidos como prostaglandinas (PGE2, PGD2 e PGF2 e tromboxanes (TXA2 e TXB2).

Como os ácidos graxos omega-3 influenciam a resposta inflamatória?

A ingestão de ácidos graxos n-3 provoca alterações estruturais e funcionais na membrana celular fosfolipídica. A fluidez da membrana celular aumenta e permite maior mobilidade das proteínas de membrana e favorece maior troca de sinais de transdução, interação hormônio-receptor e transporte de substratos. Durante a suplementação dietética com óleo de peixe ocorre integração de ácidos graxos w-3 na membrana celular em 72 horas. A menor incorporação do ácido araquidônico na membrana celular ocorre provavelmente pela preferência da enzima -desaturase pelos ácidos graxos n-3. Ácidos graxos n-3, competem com o ácido araquidônico como substrato para síntese de prostaglandinas e leucotrienos. Com a maior disponibilidade de n-3 a síntese de prostaglandinas (PG) e tromboxanes (TX) da série 2 e leucotrienos (LT) da série 4 diminui, sendo substituída pela síntese de prostaglandinas e leucotrienos das séries 3 e 5 respectivamente. As PG, TX e LT das séries 3 e 5 são mediadores inflamatórios menos potentes, podendo modular a resposta inflamatória exacerbada

Existe deficiência de ácidos graxos n-3?

Os ácidos graxos n-3 são considerados essenciais e, embora as necessidades diárias (44 mg/kg/dia) sejam muito pequenas, sua deficiência pode acarretar manifestações clínicas como dermatite esfoliativa e hemorrágica, foliculite hemorrágica do couro cabeludo, retardo do crescimento e dificuldade de cicatrização.

Em que situações clínicas pode-se usar os ácidos graxos omega-3?

A modulação de efeitos inflamatórios trouxe avanços no estudo da influência doa ácidos graxos omega-3 em doença cardiovascular, psoríase, cancer e condições de infecção grave. A suplementação dietética com óleo de peixe promove modificações estruturais da parede vascular e crase sangüínea e menor reatividade plaquetária. Efeitos como hipotrigliceridêmico e hipocolesterolêmico, maior tempo de sangramento, inibição da agregação plaquetária e efeitos benéficos sobre a pressão arterial foram observados durante suplamentação do óleo de peixe. O uso do óleo de peixe pode apresentar efeitos benéficos em psoríase, dermatite atópica e artrite reumatóide. O uso do óleo de peixe impede a ativação da proteína C quinase, diminuindo assim a produção de anfiregulina e outros fatores tróficos autócrinos pelos queratinócitos, responsáveis pela lesão cutânea da psoríase e pode promover melhora clínica do eritema, infiltração e descamação. Pacientes com colite ulcerativa têm uma resposta inflamatória aumentada em seu cólon. A mucosa colônica apresenta níveis elevados de leucotrieno B4 em relação à população normal. A utilização do óleo de peixe pode ser benéfica ao portador de doença inflamatória intestinal quando utilizado unicamente ou associado a outros nutrientes e fármacos específicos.

Existem efeitos colaterais ou contraindicações do uso do óleo de peixe?

O uso de óleo de peixe na dieta não é inócuo. Os peixes podem estar contaminados com metais pesados e pesticidas, muito embora no processo de concentração do óleo de peixe, estes compostos são geralmente removidos. Óleo de peixe está comercialmente disponível sem as vitaminas A e D para eliminar o risco de intoxicação, por excesso, com estas vitaminas lipossolúveis. Por sua ação antiagregante plaquetária, o consumo do óleo de peixe traz risco de sangramento, que é consideravelmente menor quando comparado à ingestão de aspirina. Pacientes que fizeram uso prolongado (8 semanas) do óleo de peixe apresentaram mau hálito durante seu uso. Efeitos como náuseas, eructações e meteorismo abdominal também foram relatados. Como ocorre com todos os novos fármacos, um grande volume de conhecimentos está se formando em torno do uso fármaco-nutricional terapêutico do óleo de peixe. Recomenda-se que o bom senso, cautela e o acompanhamento da literatura prevaleçam para sua indicação. Assim, a ministração de óleo de peixe, especialmente a crianças, adolescentes e gestantes deve ter acompanhamento médico rigoroso, a fim de se observar efeitos colaterais precocemente, já que nesses pacientes as ações farmacológicas deste óleo não estão bem estudadas.

Referências bibliográficas:

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